quarta-feira, outubro 20, 2004

A DÉCADA DE 70 - PARTE V – AZUL CINZENTO - A Época de 76/77



No final da época de 75/76, a nossa equipa de futebol, que tivera uma época brilhante, sofreu uma nova sangria, a que acresceram alguns percalços como (salvo erro) a prolongada lesão de Vasques. Mas esse facto tem sido objecto de mais uma das muitas mistificações que nos pretendem colar a determinado(s) clubes(s) para alinharmos nas suas guerra(s) contra outros.

Defendo um Belenenses equidistante dos 3 clubes cada vez mais privilegiados do futebol e desporto português, e que, pelo contrário, ajude a congregar a justa reacção dos restantes clubes. Sempre estive contra a situação de recorrer a empréstimos, que sempre nos subalterniza e torna dependentes, venham eles do Benfica, do Porto ou do Sporting (coisa diferente, é se vierem de clubes estrangeiros) e que sempre, mas sempre, deu maus resultados (são factos! E podem ser sempre verificados, até...). Sempre fui contra alianças com o Benfica contra o Porto, com o Porto contra o Benfica e o Sporting, com o Sporting contra não sei o quê. A esta luz, gostava de repor a verdade face às afirmações do género "foi o Porto que de repente nos levou os jogadores todos e nos deu cabo da equipa, portanto vamos aliar-nos aos outros clubes de Lisboa contra eles". Assim, mais uma vez com factos, relembremos como foi sendo desmembrado o notável grupo de jogadores que se haviam reunido:

Fim da época 73/74:

Eliseu e Luís Carlos voltam para o Brasil
Mourinho termina carreira
Murça sai para o F.C.Porto

Fim da época 74/75:

Quinito sai para o Santander

Fim da época 75/76:

Pietra sai para o Benfica
Freitas sai para o Porto

Mais tarde, já numa fase muito cinzenta, teríamos as saídas de Gonzalez para o Porto (no fim da época 76/77), de Delgado para o Benfica (salvo erro no fim de 78/79. Ou seria 79/80? Tenho que confirmar) e, depois, de Melo, Nogueira e Esmoriz para o Sporting, entre 79 e 81. Portanto, as saídas foram bastante distribuídas e acho lamentável que se distorçam os factos para nos envolver em guerras de que, qualquer que seja o(s) aliados(s) ou o(s) inimigo(s), saímos sempre a perder...

Com a equipa mais uma vez enfraquecida, a época de 76/77 foi um primeiro grande passo em direcção ao abismo, com a “prestimosa” ajuda de árbitros que nos prejudicaram escandalosamente durante essa época. A 2 jornadas do fim, ainda estávamos em risco de despromoção. Ficámos livres, ao vencer penosamente o Atlético por 2-1. O Atlético desceu da 1ª Divisão para não mais voltar e alguns (maus) belenenses tiveram a ideia de ir à Tapadinha, na última jornada, acenar-lhes com lenços brancos (o que eles retribuíram quando da nossa 1ª descida. Mas a primeira e má iniciativa foi nossa, sejamos justos, porque nenhum clube tem o monopólio das boas ou más pessoas), enquanto a nossa equipa, esfrangalhada e apática, era massacrada nas Antas por 8-0, com Gomes a marcar golos em série na última meia hora até ganhar a bota de prata, numa tarde de angústia e vergonha.

E boas recordações?

Para o campeonato, basicamente duas: uma vitória por 2-0 sobre o F.C.Porto (o que na altura não era um feito por aí além, pois não havia a décalage que se foi gerando posteriormente), com o treinador Carlos Silva (um belenenses de alma, como jogador, treinador e sócio) a chorar de comoção agarrado aos jogadores no último jogo da 1ª volta e, poucas jornadas depois (na melhor fase da equipa), um empate 1-1 na Luz, consentido a escassos minutos do fim (no jogo da 1ª volta, à 5ª ou 6ª jornada, no Restelo, cheiíssimo, com perto de 50.000 pessoas), o Benfica, que tinha começado pessimamente o campeonato – que acabou por ganhar -, aos 10 minutos já ganhava por 3-0! Recompôs-se o Belenenses, na 1ª parte ainda reduzimos para 1-3, na 2º parte fizemos 2-3, podíamos bem ter chegado ao empate, mas aqueles 10minutos loucos deram cabo de nós...).

No entanto, a memória mais agradável, apesar do azar que nos perseguiu, foi a eliminatória da Taça UEFA com o Barcelona (já é sina!).

A primeira mão foi no Restelo, em 15 de Setembro de 1976. Estava uma excelente assistência. “A Bola” falou em 35.000 pessoas. Assim na edição de 16 de Setembro de 1976, podemos ler na pág. 5, o seguinte:

“ NÚMEROS DO RESTELO”
1500 CONTOS
35 MIL PESSOAS

Apesar da falta de Cruijff, a grande "estrela dos catalães", o certo é que o nome do Barcelona levou muita gente ao Estádio do Restelo para ver em acção o "seu" Belenenses contra um dos "papões" do futebol europeu.

(...)

Segundo fomos informados no final da partida, o Belenenses deve ter arrecado cerca de 1500 contos provenientes de 35 mil pessoas”

Note-se a expressão “SEU BELENENSES”..... O nome da Barcelona atraiu muita gente mas, atenção, gente do Belenenses. CERCA DE 35.000 PESSOAS, com bilhetes caros e numa fase de generalizado aperto de cinto.

O Barcelona, de facto, estava recheado de estrelas, onde sobressaía o extraordinário Cruijf mas, também, o genial médio Neeskens e o treinador Rinus Michaels, figuras de proa da laranja mecânica (a grande selecção holandesa vice campeã mundial em 74 e 78) e do grande Ajax do início dos anos 70 (curiosamente, Rinus Michaels haveria de voltar a defrontar o Belenenses, 12 anos mais tarde, quando eliminámos o Bayer Leverkusen, por ele então treinado. Em ambas as vezes, elogiou muito o Belenenses. Um verdadeiro senhor!) e ainda, por exemplo, o argentino Herédia, e internacionais espanhóis de grande cartel (históricos do seu país), com destaque para Asensi.

Recordo-me com entranhado carinho dessa noite. O Barcelona parecia tão grande e a nossa equipa tão enfraquecida (pela referida sangria). E pior as coisas ficaram quando, cerca dos 15 minutos, o Barça fez 1-0....No entanto, a pouco e pouco, passou a nervoseira, o Belenenses empertigou-se, encheu o peito e, aos 29 minutos, Quaresma, a passe de Alfredo empatou! Uma grande explosão de alegria!

A 2ª parte trouxe um cenário bem diferente. Agora, o Belenenses sentia que podia ganhar o jogo e ir disputar a 2ª mão em vantagem. A equipa e o público acreditaram, empolgaram-se e, aos 55 minutos, chegámos aos 2-1, com golo de Luís Horta em livre directo: 2-1! Foi o delírio! O estádio fervilhava de entusiasmo! Continuámos ao ataque, a procurar aumentar a vantagem, para o que dispusemos de várias oportunidades, até que, numa jogada individual de Herédia, a pouco mais de 5 m do fim, o Barcelona empatou. Não merecia...mas empatou!

Passadas 2 semanas, fomos disputar a 2ª mão à Catalunha. Aparentemente, estaríamos condenados. E a ideia parecia ganhar consistência porque, logo a abrir, o Barcelona fez 1-0. No entanto, ainda antes do intervalo, igualámos o marcador. Na 2ª parte, o Barça faz 2-1 e o Belenenses empata o jogo e a eliminatória (empate total: 2-2 em ambos os jogos). Só que, a 3 ou 4 minutos do fim, o “golpe do costume”, com o 3-2 para o Barcelona. Dizia o grande Quaresma, um jogador 100% Belenenses: “Quando vi o árbitro a apontar para o centro do terreno, como que a sentenciar a nossa eliminação, apeteceu-me esmurrá-lo!”.

O resto da época futebolística, como disse, foi triste e, para mim (ou quanto a mim), parece marcar uma viragem para os tempos “modernos”, de um Belenenses encolhido e acinzentado.

Mas não quero acabar com tristeza. Lembremos que, nessa época, nos sagrámos novamente Campeões Nacionais de Andebol. E o Pavilhão continuava a ser construído...

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